Instituições do Estado Democrático de Direito e Desenvolvimento Político e Social
A linha investiga o funcionamento das instituições do Estado Democrático de Direito responsáveis pela produção, interpretação, aplicação e ensino do direito, tal como configuradas nos âmbitos constitucional e internacional público. O estudo do Poder Judiciário, das políticas públicas, do acesso à justiça, e das instituições internacionais, assim como dos mecanismos de responsabilização em sociedades de risco, com ênfase na reflexão sobre direitos humanos, como direito à saúde, e nas mudanças climáticas, capacidades individuais, democracia e controle do Estado, busca favorecer a compreensão dos mecanismos jurídicos públicos que habilitam ou constrangem a realização do Estado Democrático de Direito. Estão aqui incluídas, especialmente, questões que circundam o Direito constitucional, o Direito financeiro e tributário, no que diz respeito à sua relação com as políticas sociais e finanças públicas, o Direito penal, tanto do ponto de vista dos direitos humanos como a partir de temas mais ligados ao controle do Estado, como a relação entre atores públicos e privado, e o Direito processual civil, dentro de uma abordagem voltada ao acesso à justiça de grupos vulneráveis. Esta linha, portanto, tem em conta as noções de capacidades humanas, autonomia dos indivíduos, com especial atenção para a interseccionalidade de questões econômico-sociais como gênero, raça, classe, identidade e orientação sexual, e liberdades públicas, que, ao lado do crescimento econômico, tem constituído a agenda do desenvolvimento. Nesse sentido, as linhas se complementam na compreensão mais ampla do processo de desenvolvimento em suas multifacetadas dimensões.
Conheça a linha de Instituições do Estado Democrático de Direito e Desenvolvimento Político e Social do Mestrado e Doutorado Acadêmico da FGV Direito SP com as professoras Flávia Püschel, Maíra Rocha Machado, Marta Machado, Daniel Wang, José Garcez Ghirardi, Michelle Rattón (vídeo ao lado) e Raquel Pimenta.
Projetos de pesquisa
Acesso à Justiça, acesso a direitos e performance institucional
Docente associado: Luciana Gross Siqueira Cunha e Maria Cecília de Araújo Asperti
Descrição: O projeto tem como objetivo produzir dados sobre o acesso à justiça, com foco nas pessoas, ou seja, aqueles que procuram as instituições do sistema de justiça ou outros meios de solução de conflito, e experienciam desafios e obstáculos para terem seus direitos garantidos. Com ênfase principalmente na Justiça cível, os dados produzidos têm como fonte as pessoas que buscam solucionar seus conflitos por meio de instrumentos reconhecidos pelo Estado. Nesse sentido, o projeto também tem como objetivo identificar e analisar as formas pelas quais as instituições processam tais conflitos e respondem à população. Marcadores sociais e econômicos como gênero, raça e cor, de renda e geográficos fazem parte dos recortes possíveis para a investigação, assim como as demais vulnerabilidades. Ainda sob a perspectiva da influência das desigualdades na prestação jurisdicional, o projeto também propõe um olhar crítico para os instrumentos processuais e para diagnósticos do seu uso no Judiciário, com estudos sobre a regulação e a aplicação prática do processo coletivo, do processo estrutural, dos mecanismos de julgamento de casos repetitivos, dos instrumentos de formação de precedentes, dentre outros, reconhecendo a sua não neutralidade e a relevância de um olhar crítico para a sua formatação e aplicação pelo Judiciário. Nessa mesma perspectiva, também é preciso investigar os obstáculos processuais impostos a grupos vulnerabilizados (gênero, raça, idade, geografia, classe, pessoas com deficiência etc.) no âmbito da Justiça civil. Fazem parte desse projeto, ainda, pesquisas que analisam discursos do Poder Judiciário sobre litigiosidade e litigância para questionar suas origens e repercussões, bem como estudos que problematizem os limites e as possibilidades do uso da tecnologia pelas cortes, sempre com foco nas repercussões dessas inovações no acesso à justiça.
Acesso à Justiça, desastres e mudanças climáticas
Docente associado: Luciana Gross Siqueira Cunha e Maria Cecília de Araújo Asperti
Descrição: Com a participação de pesquisadoras(es) de diversas áreas do Direito e saberes afins, com linhas de pesquisa e de atuação que convergem para a temática de Direito dos desastres, gestão de riscos, litigância climática e busca pela participação e centralidade decisória das pessoas atingidas, o projeto de pesquisa busca construir um instrumental teórico e um arcabouço metodológico que deem conta de produzir e analisar dados sobre desastres tecnológicos e aqueles decorrentes de eventos climáticos extremos.
Crise do Estado e desafios para a democracia no Brasil
Docente associado: Jose Garcez Ghirardi
Descrição: Este projeto tem por objetivo examinar as mudanças nos discursos de legitimação, nos desenhos e práticas institucionais, nos modos de financiamento do aparelho estatal e nas garantias políticas dentro do contexto das transformações contemporâneas do Estado, das formas de produção e da subjetividade. De modo específico, busca-se analisar o modo pelo qual essas transformações se manifestam no Brasil, e a maneira pela qual elas poderiam afetar o funcionamento da democracia e das políticas públicas. A recente crise política brasileira, para lá de suas razões conjunturais, permite entrever desafios mais graves e mais profundos para o país. Ela sugere, de um lado, uma insatisfação instalada com o funcionamento da democracia, que se traduz em uma crise de legitimidade das instituições. Pesquisas de opinião recentes mostram o descontentamento da população com os partidos políticos (apenas 6% dos brasileiros lhes devotam confiança), com o Governo Federal e Congresso Nacional (11% e 12% de confiança, respectivamente). Em contraste, as Forças Armadas e a Igreja Católica merecem a confiança, respectivamente, de 61% e 57% dos entrevistados. Por outro lado, a virulência das recentes confrontações políticas revela uma fratura profunda nas leituras que diferentes grupos sociais fazem do Estado e de seu papel para os problemas brasileiros. Este projeto tem por objetivo compreender melhor esse quadro, seus fundamentos e suas implicações. Assume-se como ponto de partida que ele representa uma manifestação particular de uma crise geral nos modos de pensar, organizar, financiar e imaginar o Estado, que tem lugar no contexto da globalização, das transformações contemporâneas nas formas de produção de riquezas e da subjetividade. No caso brasileiro, esse movimento geral tem efeitos bem evidentes. A importância dos investimentos estrangeiros para o país cria motivos para que os governos busquem estabelecer um ambiente regulatório atrativo para o capital estrangeiro. Ao mesmo tempo, a dependência desse tipo de recursos torna o país mais vulnerável às recorrentes crises nos mercados financeiros globais e reduz, na prática, sua capacidade de elaborar e implementar, de maneira autônoma, suas políticas. Tornando a situação ainda mais complexa, a Constituição de 1998 aumentou de maneira importante as obrigações do Estado. Uma série de novos direitos foi criada sem que tenha havido previsão clara de formas para sua implementação efetiva. A busca por estruturas econômica e politicamente viáveis de financiamento para esses direitos coloca no centro da cena a questão tributária, seja em sua dimensão de instrumento para alavancar a eficiência econômica, seja como elemento para reduzir a desigualdade social. Para buscar enfrentar esses desafios importa discutir, em primeiro lugar, a própria noção de Estado, que, antes visto como uma garantia para as liberdades individuais, é atualmente percebido, amiúde, como ameaça. Ao mesmo tempo, o Estado conhece um duplo enfraquecimento, em sua capacidade de ação e em seus discursos de legitimação. No que tange à capacidade de ação, a globalização impõe limites à tomada de decisões em âmbito nacional; no que concerne aos discursos de legitimação, a corrosão dos pressupostos da modernidade industrial afetou fortemente os fundamentos simbólicos da autoridade estatal. Essas mudanças se articulam com as novas exigências derivadas de maneiras também novas de construir identidades e de exigir reconhecimento que problematizam a legitimidade de políticas públicas ao desestabilizar leituras tradicionais da igualdade. Essas novas políticas identitárias dialogam com novas maneiras de se compreender a subjetividade. Vista, por vezes, como fenômeno sobretudo negativo, essa mudança pode permitir, também, imaginar uma renovação dos espaços públicos. É este cenário de mutações que se busca investigar.
Desafios da governança global
Docente associado: Thiago de Souza Amparo
Descrição: Considerando que a governança global regula as relações entre os Estados, organizações e instituições internacionais e atores não estatais em temas cruciais para o desenvolvimento em suas multifacetadas dimensões, este projeto busca compreender de que maneira Direito internacional está apto a lidar com as complexidades globais, entre elas mudança climática, deslocamentos humanos e empresas e direitos humanos, com especial atenção para a interseccionalidade de questões econômico-sociais como gênero, raça, classe, identidade e orientação sexual. Por meio de estudos críticos de Direito internacional, este projeto se debruça sobre os principais desafios opostos aos atores globais para avançar com a pauta de proteção e promoção de direitos humanos e da democracia através da análise de mecanismos jurídicos internacionais, relatórios de organizações nacionais e internacionais, além de dados sobre governança global e tendências do setor privado em temas de direitos humanos.
Direito e violência de Estado
Docente associado: Maira Rocha Machado e Maria Cecília de Araújo Asperti
Descrição: A violência perpetrada por agentes do Estado é um dos principais problemas que constrangem a realização do Estado Democrático de Direito. Este projeto investiga as múltiplas formas de produção, registro e ocultação de violências pelas instituições do Estado, com especial atenção para a interseccionalidade de questões econômico-sociais como gênero, raça e classe. Atento às dimensões teóricas, normativas, institucionais e espaciais do fenômeno este projeto se desdobra e concretiza em pesquisas empíricas em Direito baseadas em análise documental e entrevistas com pessoas atingidas pela violência de Estado, dentro e fora das instituições. Também analisa os obstáculos enfrentados para o acesso à Justiça de vítimas de violência de Estado na busca pela reparação e pelo resguardo da memória, em linha com a garantia de não repetição. Os tópicos aglutinadores dessas pesquisas são (i) o Massacre do Carandiru e os debates sobre o território da antiga Casa de Detenção e sobre as pessoas sobreviventes; (ii) a letalidade prisional e as questões de Direito e de saúde nas práticas judiciárias e administrativas no cumprimento de pena; (iii) litígios individuais e coletivos voltados à reparação e à mudanças estruturais ligados à violência de Estado; e (iv) as questões dogmáticas, políticas e humanas sobre a formação e a disputa atual do aparato normativo brasileiro contemporâneo, em especial do Código Penal, do Código de Processo Penal, da Lei de Execução Penal e sua interação com direitos humanos e fundamentais, compreendidos como essenciais as capacidades humanas e autonomia dos indivíduos, necessárias ao desenvolvimento democrático e social.
Críticas 2.0: (re)contextualizações a partir do Brasil
Docente associado: Michelle Ratton Sanchez Badin
Descrição: Desenvolvido no âmbito do Núcleo de Direito Global e Desenvolvimento (NDGD) em parceria com a UFRGS e o IRI-USP, o projeto parte da premissa segundo a qual o Direito internacional foi equivocadamente lido no tempo como um instrumento teórico e prático universal alheio a diversas tradições jurídicas. Nesse sentido, é importante compreender como diferentes tradições jurídicas trabalham e conceituam o campo - a começar pela tradição jurídica brasileira. Nessa segunda fase, o projeto de pesquisa pretende analisar como o Direito internacional é construído no Brasil, a partir de compreensão de quem o produz e quem o utiliza. Novamente, as teorias críticas com aporte para o Direito internacional e a profissionalização da carreira jurídica são bases centrais para conceituação do projeto. Este projeto se encontra em diálogo com as duas linhas de pesquisa do Programa de Mestrado e Doutorado Acadêmicos em Direito e Desenvolvimento no âmbito da FGV Direito SP, na medida em que além da base teórica procura compreender a profissionalização do Direito internacional, nos campos da política pública e do âmbito privado dos negócios.
Direito penal e sistema de Justiça criminal: reforma e controle da atividade policial
Docente associado: Marta Rodriguez de Assis Machado
Descrição: O projeto, surgido a partir da continuidade das reflexões de projetos anteriores e das atividades desenvolvidas no Núcleo de Estudos sobre o Crime e a Pena, dedica-se à produção de conhecimento sobre o campo do Direito penal, com foco não apenas nas dinâmicas normativas (como o processo legislativo e a dogmática penal) e institucionais do sistema de justiça criminal, mas também nas dinâmicas relacionadas às políticas institucionais ligadas à segurança pública, notadamente no controle dos agentes públicos, em especial a atuação policial, e seus efeitos. Nesta fase, alguns aspectos são centrais: o primeiro diz respeito ao processo de reforma da polícia a partir do movimento de atores distintos, especialmente ligados aos direitos humanos, as implicações dessa mobilização e as razões sociais e políticas que frustraram a adoção de uma política pública capaz de promover efetiva reforma das forças policiais no Brasil, resistente a mudança democrática. O segundo diz respeito a casos envolvendo abordagem policial, perfilamento racial (stop and frisk e racial profiling), a legitimidade conferida à atuação policial pelo Poder Judiciário, assim como a ausência de um controle (constitucionalmente previsto) da atividade policial pelos atores do sistema de justiça criminal. Ainda, o projeto busca melhor compreender de forma mais ampla os efeitos das políticas estatais de segurança na sociedade e como as escolhas político-institucionais afetam a criminalidade e a violência, inclusive a ligada ao próprio Estado, observando como o sistema de Justiça criminal pode restringir as capacidades humanas, a autonomia dos indivíduos e as liberdades públicas. O projeto busca, portanto, abordar o tema do Direito penal e das instituições responsáveis pela sua construção, aplicação e reforma sob a lente dos direitos humanos e das questões de raça, gênero e classe. Por meio deste recorte o projeto busca uma concepção ampla de democracia, que vai além dos direitos políticos tradicionais e inclui a proteção adequada e a representação de grupos minoritários. Por meio do emprego de métodos empíricos e do diálogo interdisciplinar com áreas como a antropologia, sociologia e ciência política o projeto pretende produzir um conhecimento mais preciso dos diagnósticos sobre o tema e das potencialidades e obstáculos para a garantia de uma atuação do sistema de justiça criminal adequada ao Estado Democrático de Direito, essencial ao desenvolvimento em sua concepção ampla.
Ensino jurídico, capitalismo e democracia
Docente associado: José Garcez Ghirardi
Descrição: Não existe lugar ou ponto de vista externo à história e à sociedade, ou “logicamente anterior” a elas, onde pudéssemos nos situar para teorizá-las – para inspecioná-las, contemplá-las, afirmar a necessidade determinada de serem como são, “constituí-las”, refleti-las ou representá-las em sua totalidade. Todo pensamento sobre a sociedade e a história pertence, ele mesmo, à sociedade e à história. Todo pensamento, qualquer que seja ele e qualquer que seja seu “objeto”, não é senão um modo e uma forma do fazer histórico-social” (Cornelius Castoriadis, L’institution imaginaire de la société, p.8). As faculdades de Direito são instituições inserida nos processos de produção e reprodução material e simbólica da sociedade. É dentro de seus muros que se molda a concepção específica de rule of law que irá nortear as relações entre os cidadãos em sociedades democráticas. Os cursos jurídicos formulam e consolidam o entendimento que os juristas terão sobre as fronteiras que delimitam seu objeto de estudo e de trabalho, bem como seu sentido, sua função e suas condições de legitimidade. Esse imaginário acadêmico-profissional, por sua vez, irá determinar as formas pelas quais a sociedade, de forma geral, entenderá o Direito e as expectativas que nutrirá em relação a seus operadores e suas instituições. A percepção popular sobre a qualidade da democracia, como um todo, e do sistema de Justiça, em particular, é produto, em larga medida, da teorização gestada nos debates acadêmicos e normalizada em sala de aula. Como observa Harold Berman, ensinar o Direito e constituir o Direito são atividades dialéticas, o que torna inextricável o trabalho de teóricos do Direito e de operadores do Direito: “O conjunto de conhecimento jurídico em que são treinados os especialistas do Direito guarda uma relação complexa, dialética, com as instituições jurídicas, uma vez que, de um lado, o conhecimento descreve tais instituições mas, de outro, as instituições jurídicas que, de outro modo, seriam disparatadas e desorganizadas, se tornam conceituadas e sistematizadas e, portanto, transformadas, por aquilo que se diz sobre elas em tratados eruditos, em artigos e na sala de aula.” O fluxo entre instituições, prática profissional e atividade acadêmica, entre práxis e teoria é, assim, de mão dupla. Ele manifesta e constrói leituras sobre a função social das instituições jurídicas e sobre a natureza do Direito. A educação fornecida pelas faculdades de Direito é resultado do processo de normalização da forma academicamente hegemônica de se realizar essa leitura. O processo dialético de construção de uma imagem do Direito se dá em concomitância com um processo similar de construção simbólica em relação à estrutura político-econômica e ao funcionamento da sociedade como um todo. Instrumento de regulação do social, o Direito não é pensável sem uma ideia do objeto que se propõe regular. Leituras diversas sobre as dinâmicas da vida social traduzem-se em entendimentos correspondentemente diversos sobre a relação Direito-sociedade e sobre o significado último da normatividade jurídica. As dimensões políticas, econômicas e sociais que perpassam a vida em comum não são, assim, um simples “contexto histórico” dentro do qual situar modos diversos de se conceber a formação dos juristas. Elas são a condição de inteligibilidade dessa formação porque inextricáveis da natureza mesma do Direito e dos discursos que, dialeticamente, o constroem e o tomam por objeto. Longe de serem expressão de divergências superficiais sobre metodologias, temas, materiais ou tecnologias, os debates sobre ensino jurídico são índices de diferenças político-ideológicos de largo alcance. Afirmar a superioridade de um modo específico de se ensinar o Direito ou sustentar que determinada prática é requisito para uma formação “de qualidade” é realizar uma avaliação do sentido do ensino jurídico e do Direito dentro da sociedade brasileira. Essa tarefa não se pode fazer sem que, ao mesmo tempo, se articule uma visão sobre o sentido da experiência social brasileira, suas múltiplas desigualdades, suas múltiplas causas. Esse projeto convida a uma reflexão estruturada sobre o ensino jurídico a partir do exame das conexões que ele estabelece com as formas contemporâneas de produção material e simbólica e sobre os pressupostos que embasam essas conexões. A análise desses pressupostos demanda, necessariamente, que se escrutinem discursos que, situados fora do campo jurídico, são, não obstante, fundamentais para sua legitimação, uma vez que expressam, naturalizam e reforçam construções ideológicas sobre o sentido de justiça, sobre configurações diversas de subjetividade biográfica, jurídica e política (e os arranjos que estabelecem entre si) e sobre o sentido da vida social. As narrativas literárias constituem um dos campos mais produtivos para o exame desse processo de legitimação discursiva e, portanto, integram esse projeto desde o ponto de vista do campo da Law and Literature. A tematização das relações entre ensino jurídico, capitalismo e democracia proposta por esse projeto busca situar a discussão sobre o ensino jurídico dentro do quadro mais amplo das suas relações com o capitalismo e a democracia. Essa discussão implica, necessariamente, a análise do processo de globalização que pulveriza e reconfigura espaços, fontes e lógicas normativas, e estabelece, nesse processo, um novo horizonte para a formação de juristas.
Estado de Direito e legalismo autocrático
Docentes associados: Jose Garcez Ghirardi, Marta Rodriguez de Assis Machado, Oscar Vilhena Vieira, Raquel de Mattos Pimenta e Thiago de Souza Amparo
Descrição: Desenvolvido no âmbito do Núcleo de Economia Política em parceria com a University of Oklahoma e a University of Cape Town, o projeto Estado de Direito e legalismo autoritário (PAL) investiga como o Direito pode ser utilizado para avançar, bem como ser mobilizado para resistir, a atuais projetos autoritários. Esse projeto situa a literatura e a discussão global sobre o papel do Direito e das instituições na crise da democracia em duas frentes: a primeira apresenta estudos de caso sobre o Brasil e a segunda compara a experiência brasileira com outros países do Sul global, em especial, África do Sul e Índia. Ao redor do mundo, a democracia encontra-se em retrocesso. Os últimos relatórios do V-Dem e da Freedom House documentam aumentos de práticas autocráticas e ataques às liberdades consideradas fundamentais. Diferentemente das ondas anteriores de autocratização, os danos atuais às democracias liberais estão ocorrendo de maneiras sutis e incrementais, dentro dos cronogramas eleitorais e frequentemente ocultos atrás da fachada da normalidade institucional. Legalismo autocrático (Sheppele, 2018), constitucionalismo abusivo (Landau, 2013) e captura constitucional (Müller, 2014) são alguns dos conceitos que tentam compreender o desmantelamento das democracias constitucionais por meio do uso de mecanismos legais. O projeto procura analisar, a partir de uma abordagem sociojurídica, como o direito e as instituições habilitam e resistem a projetos autocráticos, no Brasil e em perspectiva comparada (com especial foco em África do Sul e Índia).
Gênero e Direito
Docentes associados: Luciana Gross Siqueira Cunha e Maria Cecília de Araújo Asperti
Descrição: O projeto tem como objetivo geral a construção de conhecimento científico sobre problemas jurídicos brasileiros que demonstram tensões na interação entre direito, instituições, políticas públicas e questões de gênero interseccionadas com outros marcadores sociais como raça, classe, identidade e orientação sexual operam. As atividades são desenvolvidas por professoras e pesquisadoras da FGV Direito SP no âmbito do Núcleo Gênero e Direito em duas frentes: primeiro, visa promover a realização de projetos de pesquisa coletivos sobre a temática de gênero, sejam estes de pesquisas empíricas, jurídico-dogmáticas ou teóricas. O objetivo dessa primeira frente é a promoção de pesquisas de excelência que (i) iluminem o modo como o Direito participa da criação e manutenção de estruturas hierárquicas de gênero na experiência brasileira e (ii) permitam reflexões sobre medidas para promoção da igualdade de gênero por meio do Direito. Nesse sentido, o núcleo pretende combinar o trabalho acadêmico rigoroso e crítico com uma postura interventiva e propositiva, por meio da produção de artigos acadêmicos e de outras formas de intervenção no debate público. Na segunda frente, o núcleo pretende ser um espaço para a discussão de trabalhos sobre Direito e gênero, integrando pesquisadoras e pesquisadores não só do próprio núcleo e da comunidade FGV Direito SP, mas também de outras instituições nacionais e estrangeiras. Para isso o núcleo conta com um workshop quinzenal de discussão de working papers e/ou textos relevantes para pesquisas de participantes, sedia eventos e pretende, no futuro, acolher pós-doutorandas e pós-doutorandos. O objetivo dessa segunda frente é não só auxiliar pesquisadoras e pesquisadores a atingir excelência em seus trabalhos, como também o de participar da construção de uma comunidade acadêmica integrada e colaborativa na área.
Instituições e as relações público-privadas na produção normativa
Docente associado: Daniel Wei Liang Wang
Descrição: A linha de pesquisa estuda como as relações público-privadas afetam e são afetadas pelos diversos arranjos institucionais de produção de normas. De um lado, os arranjos que permitem ou dificultam a interação entre instituições estatais, grupos de interesse, empresas e usuários de serviços podem acabar influenciando no resultado do processo de produção normativa. De outro, atores privados, sabendo que processo impacta resultado, também tentarão moldar o processo para buscar resultados que lhe sejam economicamente ou politicamente mais favoráveis. Essa linha de pesquisa abriga, por exemplo, projetos que estudam o processo legislativo, abrangendo estudos sobre propostas legislativas de regulação das relações governamentais – o lobby sobre a regulação do lobby – além de trabalhos que buscam entendem os interesses envolvidos na discussão legislativa sobre regulação de novas tecnologias, com a identificação dos argumentos que contrapõem o risco tecnológico e a promoção da inovação no setor privado. Essa linha inclui também decisões no âmbito do Executivo, incluindo desde o estudo da produção regulatória por parte de agências quanto arranjos jurídico-institucionais em parcerias entre os setores público e privado.
Judicialização da saúde: novos debates e inovações institucionais
Docente associado: Daniel Wei Liang Wang
Descrição: A saúde, e a existência de políticas adequadas ao seu acesso, pode ser considerado um direito fundamental, ligado diretamente a realização das capacidades individuais em um Estado Democrático de Direito. O tema da judicialização da saúde tem sido objeto de uma vasta literatura para entender o que se demanda, o perfil de litigantes, como decidem os tribunais e os impactos sobre as políticas de saúde. Nos últimos anos, frente ao aumento exponencial de demandas por tratamentos médicos, surgiram novos debates e inovações institucionais. Um debate que tem ganho importância é com relação à competência federativa para legislar sobre saúde pública (tema que ganhou importância durante a pandemia de Covid-19 e o governo Bolsonaro) e para realizar políticas públicas em saúde (objeto de dois temas de repercussão geral no STF, o 793 e o 1234). Dentre as inovações está o estabelecimento de teses de repercussão geral em matéria de saúde para pacificar questões controversas em instâncias inferiores e a instituição de Núcleos de Assistência Técnica do Judiciário (NatJus) para assessorar o Poder Judiciário a decidirem demandas em saúde.
Jurisdição constitucional, direitos fundamentais e desenho institucional
Docentes associados: Daniel Wei Liang Wang, Dimitrios Dimoulis, Luciana Gross Siqueira Cunha e Oscar Vilhena Vieira
Descrição: Este projeto procura analisar o processo de constitucionalização da democracia brasileira com três objetivos principais, estreitamente interligados. Assim sendo, o projeto procura: i) analisar o papel do STF no exercício do controle de constitucionalidade por meio de pesquisas jurisprudenciais, análise da relação do tribunal com os demais poderes, identificação e verificação dos modelos de interpretação utilizados pelos ministros do STF em suas decisões e estudo comparado de Cortes constitucionais; ii) estudar a interpretação e concretização dos direitos fundamentais no Direito nacional e estrangeiro a partir da perspectiva processual da justiça constitucional e de questões pontuais de teoria (geral) do Direito, especificamente no que diz respeito a opções metodológicas sobre a interpretação do Direito constitucional e problemas de teoria da norma; iii) estudar o desenho político, social e econômico adotado por marcos legais, nacional e internacionalmente, e a sua relação com o Estado Democrático de Direito.
Mobilização social e Direito: mobilização de gênero, anti-racismo e direitos humanos no sistema de Justiça
Docente associado: Marta Rodriguez de Assis Machado
Descrição: Desenvolvido no âmbito do Núcleo de Estudos sobre Crime e Pena, este projeto reúne pesquisas sobre a relação, via Judiciário, entre o Direito e mobilizações sociais referentes aos direitos humanos. Mais especificamente, essa relação é explorada em estudos empíricos que têm como objetos as decisões proferidas no sistema de justiça sobre questões de gênero e questões raciais. Trata-se de um projeto que objetiva identificar como o Judiciário responde a demandas sociais sobre direitos humanos e, a partir dessa identificação (observação, descrição), propor avaliações jurídicas, inclusive nos domínios da dogmática jurídica empiricamente informada. Projeto financiado pelo INTPART (Research Council of Norway). Parceria com Debora Maciel (Unifesp), Rafael de Souza (USP/Cebrap), Camilla Gianella (Ch. Michelsen Institute/PUC-Peru), Angelica Peñas (Conicet), Siri Gloppen (University of Bergen), Rachel Sieder (Ciesas), Marcia Lima (USP/Cebrap).
O Direito na era digital
Docente associado: Jose Garcez Ghirardi
Descrição: O projeto parte do diagnóstico de que o avanço tecnológico tem modificado relações sociais, econômicas e políticas. No Direito, isso se refletiu em criação de novas áreas (como Direito digital, proteção de dados pessoais, crimes eletrônicos), surgimento de novos desenhos regulatórios (como sandbox regulatório) e transformação do papel dos profissionais. Ao mesmo tempo, as ferramentas de automação de tarefas cognitivas e de inteligência artificial intensificaram a relação de profissionais do Direito com a tecnologia. Nesse contexto, o objetivo do projeto é compreender: (i) as múltiplas dimensões do avanço tecnológico e suas implicações para os modos reger as relações sociais advindas do novo cenário que delas deriva; e (ii) o impacto dessas tecnologias sobre as profissões jurídicas e sobre a formação dos estudantes nos cursos de Direito; (iii) maneiras de conciliar o desenvolvimento tecnológico com pautas políticas, éticas e sociais de desenvolvimento da sociedade e do Estado brasileiro. Com base nessa compreensão, a equipe do projeto pretende fomentar debates sobre a o sentido e a regulação das novas tecnologias, buscando contribuir para a formulação de políticas públicas e de programas de formação profissional que estejam alinhados com as necessidades futuras do mercado jurídico. A internacionalização do projeto acontecerá em três frentes: a) visitas, por meio de missões internacionais, a países que apresentam significativas transformações sociais e profissionais geradas pela adoção intensiva de tecnologia, especialmente no campo jurídico; b) participação em eventos internacionais e bolsas no Brasil, para intercâmbio com docentes e profissionais estrangeiros, discutindo de temas de vanguarda no Direito; c) estudos comparados, por meio de bolsas no Brasil e no exterior, sobre o tema de Direito e tecnologia. Instituições parceiras do projeto: Austrália The Allens Hub for Technology, Law and Innovation Alemanha Wissenschaftszentrum Berlin für Sozialforschung Institute of Law and Economics, da Fakultät für Rechtswissenschaft (Law Faculty) da Universität Hamburg (University of Hamburg) Max Planck Institute for Comparative and International Private Law Noruega Centre on Law and Social Transformation – LawTransform, da Universitet I Bergen (University of Bergen) e do Chr. Michelsen Institute (CMI) Reino Unido School of Global Affairs, do King’s College London Script Centre for IT and IP law, da School of Law, University of Edinburgh.
Regulação e conflito: licenciamento ambiental
Docente associado: Dimitri Dimoulis
Descrição: A discussão sobre os critérios para a execução de atividades potencialmente degradantes ao meio ambiente é frequente no debate público. Se, por um lado, a burocracia no licenciamento ambiental pode prejudicar o desenvolvimento econômico e instigar práticas de corrupção, por outro, tragédias ambientais como as de Mariana e Brumadinho mostram a importância de existirem e serem aplicadas condicionantes ao licenciamento ambiental e de se fiscalizar a execução de atividades potencialmente danosas. A legislação compartilha entre todos os entes da federação a atribuição de licenciar atividades e empreendimentos (artigo 7º a 9º da Lei Complementar nº 140/2011), e a Constituição Federal confere competência concorrente aos entes federativos para legislarem, no limite do interesse local, sobre a proteção do meio ambiente. Dada a amplitude de stakeholders e a ampla gama desses com capacidade regulatória, diversas legislações sobre o tema surgem, estabelecendo particularidades ou novas condicionantes, mais ou menos restritivas, ao licenciamento local. Esta pesquisa investigará a pulverização de leis estaduais em matéria de licenciamento ambiental, bem como os litígios judiciais que surgem dessas leis.
Tratamento antidiscriminatório de minorias sociais
Docente associado: Dimitri Dimoulis
Descrição: A pesquisa tem como objetivo pesquisar os conceitos, os argumentos e as balizas jurisprudenciais do direito antidiscriminatório. O projeto procura identificar, expor e avaliar o tratamento legislativo e judicial, assim como os problemas de eficácia de normas que tutelam (ou deveriam tutelar) minorias sociais.
Violência racial a partir do Direito antidiscriminatório e teorias críticas
Docente associado: Thiago de Souza Amparo
Descrição: Este projeto de pesquisa visa analisar o papel do Direito antidiscriminatório na promoção da justiça racial e garantia do exercício dos direitos humanos pela população negra brasileira. Considerando a persistência das desigualdades raciais, o projeto considera estudos empíricos que têm como objeto a análise de eficácia jurídica, impacto social das leis e de decisões judiciais que envolvam questões raciais e outras conectadas com direito antidiscriminatório. Nesta seara, estuda-se elementos referentes à perpetuação da violência contra população negra, incluindo temas como violência policial, encarceramento em massa e o papel do judiciário em combater ou perpetuar violência. Ademais, busca-se abordar o tema a partir de teorias críticas raciais com vista a desenvolver o campo de estudos da violência e direito antidiscriminatório.